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março 22, 2004


Fraude Cultural


No Aviz, um post de apoio aos subsídios estatais do projecto de Belgais (meus destaques):
"Belgais não é uma peça de teatro no Bairro Alto nem um grupo «de vanguarda» que choraminga porque o Estado não cedeu à sua chantagem habitual para produzir mais um fait divers. Belgais é uma escola, um centro de investigação musical, um auditório para que músicos realmente importantes se encontrem, trabalhem e produzam música, que é um bem inestimável num país de merda que tem tagarelas à altura mas que é ignorante em matéria musical. Não se trata de «um espaço» inútil: ali, aprende-se música, conservam-se partituras, e ensina-se. Num país que ignora brutalmente as artes sérias e as ciências importantes, eu defendo que se deve apoiar Belgais. Porque cada caso é um caso, independentemente do que se possa pensar sobre a política geral de atribuição de subsídios à cultura, nível em que Belgais se salienta pela atenção que dá à formação."

Mas, se "cada caso é um caso", quem deve avaliar sobre qual o projecto merecedor dos subsídios do Estado? O Aviz? Eu???
O Aviz parece querer deixar essa tarefa aos pseudo-intelectuais do Ministério da Cultura! E, no entanto, no final do mesmo post, lamenta a escassez de donativos privados:
"Os ricos, em Nova Iorque, contribuem mais do que generosamente para que o Central Park seja limpo, ordenado, vigiado e protegido. Nos EUA, aliás, as universidades recebem dinheiro dos ricos, que financiam as suas bibliotecas e oferecem bolsas. Em Portugal, já vão longe os tempos em que os ricos -- como no Minho, por exemplo, Cupertino de Miranda -- erguiam bibliotecas, ofereciam livros, contribuíam para centros médicos e de velhice, e, sim, construíam fontanários, que eram um bem necessário e útil nas aldeias. (...) Actualmente, o mundo dos ricos é ocupado por aventesmas que mostram a sua casa nas revistas, ao lado dos políticos e das estrelas de televisão que vão à ilha da Caras, e que têm uma sensibilidade de rinoceronte. Não conhecem Belgais como não conhecem música."

Segundo o Aviz, os ricos portugueses são mais avarentos que os americanos. Contudo, a principal causa dos reduzidos apoios privados não é avareza mas, sim, o peso do Estado na economia. Este, ao assumir o papel de decisor dos projectos culturais a financiar, eliminou - através dos impostos - a liberdade de escolha de cada indivíduo.

Por exemplo, o facto de um assaltante usar o dinheiro roubado para alimentar a sua família não faz o acto, em si, menos condenável. Ao cidadão assaltado foi-lhe retirado, pelo uso da força, a opção voluntária de ajudar a família em questão. A lei, independentemente do destino do dinheiro roubado, não permite tal prática pelo que, caso seja capturado, o ladrão sujeita-se a ter de cumprir tempo de prisão. Mas, tal lei não se aplica ao Estado!!! Assim, o desinteresse pela música - e por Belgais em particular - é a consequência natural da prática de roubo impune.

Nota: se somos um país "ignorante em matéria musical", isso deve-se ao distanciamento entre projectos culturais e a sociedade civil que paga por estes. Para Maria João Pires, foi mais fácil captar o interesse de meia dúzia de burocratas! Infelizmente para Belgais, os burocratas no poder mudaram...